Enquanto vergo não parto
Ouvir música…em português, em espanhol, a luta continua!
Não quero deixar de ter aquela sensação de há uns anos… era livre, consciente, segura e sonhadora. Um pouco como o cheiro de madeira…uma madeira jovem e nobre muito perfumada.
Um sentimento de estar no lugar certo à hora certa. Como uma imagem brilhante sobre um fundo escuro. Será que algum dia recuperarei esse sentimento? Essa maneira de estar?
Essa maneira que eu tinha de estar comigo, com os outros e com o universo. Essa maneira de conseguir tomar consciência de cada recanto da mente. Cada passo era decidido, escolhido sem olhar para trás. A vontade de dançar e dançar de olhos fechados, a sentir a pulsação e a fazer vibrar o corpo EXACTAMENTE ao ritmo tocado. Abrir os olhos e sorrir, ver os vultos à minha volta, suar e voltar a fechar os olhos. Vultos cinzentos como uma mancha em slow motion…
Dias são só dias, pessoas vão e vêm, até os livros caem no esquecimento… o que é que fica? Parece-me que não fica mesmo nada. Só queria voltar a sentir aquele sentimento.
Percorrer as ruas a conversar comigo a sós. Olhar para cima, olhar em redor, conhecer as ruelas, as lojinhas, a Dona Odete da papelaria. Usava sempre o mesmo penteado meio vintage, pintava os olhos de azul e perguntava-nos “De que precisas, minha filha?” Uma borracha, um lápis HB e um caderno pautado. Que será feito dela? Que será feito de mim?
Agora estou numa das minhas aulas de psicologia do 12º ano. A sala de aula com cadeiras de madeira, as contínuas à entrada do pavilhão a contar os minutos que faltam para o almoço e eu ansiosa para que comece a aula. As nossas aulas são em estilo de fórum ou tertúlia e para mim funciona na perfeição. Gosto de olhar para as minhas colegas enquanto argumento uma questão. A professora observa atenta e com o seu olhar crítico. Todas nós queremos chamar a sua atenção. Queremos ser especiais. Mas eu de algum modo já tenho essa consciência. Já procuro a justiça entre todas, a distribuição de riqueza, que neste caso são as boas notas, para que todas fiquemos felizes. Será que a Maria Inês alguma vez percebeu isso?
Enquanto vergo não parto, enquanto choro não seco, enquanto vivo não corro à procura do que é certo (Susana Félix).